Camila Molina - O Estado de S.Paulo
29 de dezembro de 2010
Bienal, a despeito dos esforços para reerguer a mostra, não deu visibilidade à obra do transgressor Flávio de Carvalho; novo prédio do Museu de Arte Contemporânea também não ficou pronto.
A expectativa pela 29.ª Bienal de São Paulo prometia um ano mais vibrante para as artes visuais - pelo menos, na capital paulistana -, mas, afinal, em termos de programação, sem grande impacto viu-se 2010 marcado por mostras institucionais com destaque mais para artistas estrangeiros do que para brasileiros.
O otimismo do início de ano ainda se estendeu para o mercado, com a marca, em fevereiro, de novo recorde de venda em leilão: a escultura de bronze L"Homme Qui Marche I (O Homem Que Caminha I), do artista suíço Alberto Giacometti (1901-1966), foi arrematada em Londres por US$ 104,3 milhões, batendo, por pouco, os US$ 104,2 milhões pelos quais foi vendido, em 2004, o quadro Garçon a la Pipe (Menino com Cachimbo), de Picasso. Mas, infelizmente, a onda da crise econômica, principalmente, na Europa, abafou os ânimos do mercado mundial.
Mas, no caso do Brasil, houve a constância do que se pode definir como uma boa safra. Um termômetro certamente é a SP-Arte, a feira internacional de obras contemporâneas e modernas, que teve em 2010 sua 6.ª edição, no Pavilhão da Bienal. O evento aumentou de tamanho e contabilizou volume 15% maior de vendas comparado a 2009. Outro fator que indicou a pulsão do mercado brasileiro, ainda, foi um movimento de galerias paulistanas inaugurando, na cidade, espaços novos e ampliados - como a Marília Razuk, Luisa Strina e, futuramente, Raquel Arnaud - e, também, a abertura do galpão da Baró/Emma Thomas e a criação da Zíper Galeria, nos Jardins, por exemplo.
Mais ainda, em termos de recursos, o que dizer da Fundação Bienal de São Paulo? Graças ao esforço e trabalho da diretoria presidida pelo empresário Heitor Martins, a instituição está com suas contas em dia e conseguiu arrecadar a totalidade do montante que necessitava para realizar a 29.ª edição de sua mostra (leia mais ao lado) - orçada, afinal, em R$ 23,5 milhões - e também patrocínio para o início da reforma de seu prédio.
Antologias. No ano em que as artes visuais perderam a escultora francesa naturalizada americana Louise Bourgeois (aos 98 anos, em 31 de maio); o pintor alemão Sigmar Polke (aos 69 anos em 11 de junho); e os artistas paulistanos Wesley Duke Lee (aos 78 anos, em 13 de setembro) e Hércules Barsotti (aos 96 anos, no dia 21), é possível relacionar mais exposições de destaque de criadores de outros países.
São Paulo, principalmente, e Rio, abrigaram antologias importantes de estrangeiros, como a do pai da arte pop americana Andy Warhol (Estação Pinacoteca); da alemã Rebecca Horn (CCBB); do belga multimídia Jan Fabre (Instituto Tomie Ohtake); dos alemães Joseph Beuys (Sesc Pompeia/Videobrasil) e Georg Baselitz (Estação Pinacoteca); e dos americanos Fred Sandback (Instituto Moreira Salles) e a cult Laurie Anderson (CCBB).
Já na seara de brasileiros, a promessa de se fazer acender o espírito transgressor de Flávio de Carvalho (1899-1973) foi maior do que a realização de atividades em torno do artista. A retrospectiva no MAM, em abril, ficou destituída de sedução, perdendo-se no excesso de documentações e apresentando apenas as pinturas do modernista. Já a presença de Carvalho na 29.ª Bienal ficou quase totalmente apagada.
Outra promessa do ano era a abertura da nova sede do Museu de Arte Contemporânea da USP (MAC) no antigo prédio do Detran, no Ibirapuera, mas o espaço só ficará pronto em 2011. Com área expositiva de 10 mil m² - e, segundo o secretário de Cultura Andrea Matarazzo, com obra orçada em um total que chegará a cerca de R$ 70 milhões bancados pela Secretaria de Estado da Cultura -, o novo prédio do MAC deve ser inaugurado só depois de março.
Ainda na linha de eventos dedicados a criadores nacionais, um dos destaques de 2010 certamente foi a mostra antológica que a Estação Pinacoteca apresentou, em setembro, da produção de Carmela Gross, perpassando sua carreira desde a década de 1960 até hoje. A exposição mesclou a secura de trabalhos diretamente políticos, como a obra Presunto, grande corpo amorfo de lona estofada criado em 1968, e o rigor e poesia de Projeto para a Construção de Um Céu (1981). No time de criadoras, vale também destacar a intervenção Tramazul que Regina Silveira realizou por toda a fachada do Masp, na Avenida Paulista (que ficará em exibição no local até meados de janeiro). No edifício, Regina fez o que seria a projeção de um céu azul bordado no local, suspenso na arquitetura.
Já no Rio, duas mostras que tiveram muitos elogios ocorreram no MAM carioca: Fruto Estranho, de Nuno Ramos, e Salas e Abismos, de Waltercio Caldas. Voltando ao campo das antologias chegou este ano, em abril, ao País (Fundação Iberê Camargo, em Porto Alegre), a mostra O Alfabeto Enfurecido, dedicada à suíça radicada brasileira Mira Schendel e ao argentino Leon Ferrari.
A exposição, primeiramente apresentada no Museum of Modern Arte (MoMA) de Nova York, e no Museu Reina Sofia, de Madri, reforçou o prestígio de Mira no circuito internacional. Ao mesmo tempo, a mostra Anywhere Is My Land, com a produção dos anos 1960 e 70 do artista Antonio Dias, enfim foi apresentada na Pinacoteca do Estado depois de ser exibida no espaço da Coleção Daros-Latinamerica, em Zurique.